24/09/2008

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Não somente o trem, mas tudo lá fora passou a me incomodar.
Depois de vários cafés e uma mesma canção, olhei para ele e senti o primeiro maior ódio da minha vida. Em um súbito, o acomodei em meu colo e pensei nas tragédias que a sua presença ao meu lado todas as noites me causou, e assim, o odiei ainda mais. O seu perfume ainda era o mesmo daquela noite em que chegara com o absurdo mais estranho que já me foi proposto. Lembro-me bem de ter agradecido ao telefone, mas também os telefones são os causadores desta lástima. Portanto, eu os odeio. Todos eles, os meus, os dele e principalmente os dois juntos. Eu não sei ao certo qual seria o meu estado se não tivesse eu, atendido as ligações das minhas mal dormidas madrugadas. Eu também não sei se estaria assim, se tivesse recusado ir até a janela, vê-lo chegar e partir, naquela sexta que antecedeu o sábado das meias pretas. E principalmente, não sei o que escreveria se não tivesse absurdamente trocado a minha inteligência por últimos beijos que não foram dados. Cuidadosamente, levantei com o desejo já latente, fechei a porta com aquele modo estranho de fechar-se portas. A imagem do primeiro encontro e a sua camiseta branca era tão nítida, que aparecia em minhas paredes. Senti então que era o fim. A hora de partir. Com as unhas em um carmim puríssimo, fiz o nó pela última vez. Primeira volta. Segunda volta. E fechei os olhos, enquanto a canção se repetia novamente. “Tonight I'm tangled in my blanket of clouds”.
Segundos depois, desfiz o nó em desespero, como se pedisse aos céus para que meu erro fosse remediado, pois no instante do terceiro verso, me pus em arrependimento. Entendi que não podia matá-lo e que não era a hora de Alfred morrer.

para que o sublime não seja esquecido

Sobre Neblina, Propósito e Anestesia
Olhava aqueles olhos de encanto surreal e desejava continuar vendo-os durante todo o dia que anunciava-se com o sol aturdido em neblina. Eu sabia que de fato, era real, notável e que estava ali, ao alcance das mãos. E inegavelmente, não me cansava de olhar.Todas as músicas se misturavam em meus ouvidos, todo o perfume embriagava os meus pulmões e o pensamento destinava-se ao desejo...
Bom dia.Abraços.Jéssica.BoaNoite.Pijama.MilharesDeles.

11/09/2008

sobre a maior dor, novamente

Eu lembro de todas as vezes em que curiosamente era eu que dormia no seu colo. Me lembro de todas as 6587 vezes que eu tive que assistir o Relâmpago Mcqueen... lembro de todas as vezes que você me perguntava sobre as estrelas e de todas as repetidíssimas vezes que você sumiu com o meu violão... Me lembro de todos os dias que seguiram o dia da “super-bicicleta-nova” e também dos dias em que você insistiu para que eu devolvesse aquele seu terrível uniforme do palmeiras. Lembro de todas as idas a todos os shoppings possíveis e de todas as camisetinhas de listras. Lembro das nossas frases ensaiadas e de todos os nós que você fez em meus cabelos. Lembro das mordidas e dos apertos apertados. Todos eles. Me lembro da músiquinhas que a gente cantava e de todos os 10850 litros de iogurte com sucrilhos. Lembro dos superchinelinhos do Batman e de todas as vezes que você tentou contar nos dedinhos as pintinhas da Jejé. Jamais esquecerei todos os “EU TE AMOO... MUITO!!!” e principalmente do “PORCO ARANHA, PORCO ARANHA, PORCO PORCO E MAIS ARANHA... CUIDADO ELE É O PORCO ARANHA.

EU QUERO VOCÊ DE VOLTA.

TEREI VOCÊ DE VOLTA.

02/09/2008

sobre os últimos dias

(...) afinal, há é que ter paciência, dar tempo ao tempo,
já devíamos ter aprendido, e de uma vez para sempre, que o destino tem de fazer
muitos rodeios para chegar a qualquer parte (...) - Página 226
(...) Se antes de cada acto nosso nos puséssemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar (...) Página 86
(... )Quer dizer que temos palavras a mais, Quero dizer que temos sentimentos a menos, Ou temo-los, mas deixámos de usar as palavras que os expressam, E portanto perdemo-los (...) Página 277
(Trechos de Ensaio sobre a Cegueira, do português premiado pelo Nobel, José Saramago)

Ensaio Sobre a Cegueira pode ser considerado como a obra-prima do pós-modernismo lusitano. É digno de sublinhar-se o propósito de convencimento de Saramago a partir da construção minuciosa de um romance belíssimo e pleno que torna verossímil o quase absurdo que propõe. O fio condutor do (mais uma vez), romance turbulento é a exemplaridade trágica da cegueira, que acomete a cidade como situação extrema de uma realidade adversa. Trata-se de uma cegueira branca, que ilumina em vez de lançar nas trevas os que a contraem, é o símbolo da perplexidade discursal, que sobretudo, é metafórica e poética. Sua citação máxima (ao meu ver, claro) está em: "Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara" – no qual o último verbo da epígrafe, pode e deve ser interpretado com uma plurissignificação: fixa a atenção, observa; corrige, remedeia e, sobretudo, recupera.